Já sentiu aquele impulso incontrolável de fazer algo? Não consegue parar mesmo querendo?
Isso pode ser uma compulsão. E afeta mais gente do que imaginamos.
Compulsões surgem em diversos formatos. Algumas pessoas comem sem controle. Outras lavam as mãos dezenas de vezes. Há quem compre sem necessidade.
Este artigo vai explicar o que são compulsões. Vamos falar sobre seus tipos, causas e tratamentos.
Você não está sozinho nessa luta.
De acordo com Silva (2023, p. 45), “comportamentos compulsivos afetam cerca de 15% da população em algum momento da vida, interferindo significativamente na qualidade de vida e bem-estar emocional”.
Vamos entender melhor esse tema. E descobrir caminhos possíveis para lidar com ele.
O QUE É COMPULSÃO E COMO SE MANIFESTA
Compulsão é um comportamento repetitivo difícil de controlar. A pessoa sente uma urgência enorme para realizá-lo.
É como ter um comichão mental que só passa quando você faz aquela ação.
Na minha experiência clínica, pacientes descrevem a compulsão como “um tsunami mental”. Eles sabem que não deveriam agir de certa forma. Mas a pressão interna é forte demais.
Compulsões têm um padrão. Primeiro vem o desconforto ou ansiedade. Depois surge o impulso intenso. A pessoa realiza o comportamento. Sente alívio momentâneo. E logo depois, culpa.
Este ciclo se repete. Cada vez mais forte. Cada vez mais frequente.
Não é falta de força de vontade. São mecanismos cerebrais complexos em ação.
PRINCIPAIS TIPOS DE COMPORTAMENTOS COMPULSIVOS
As compulsões aparecem de várias formas. Alguns tipos são mais comuns que outros.
Para entender o conceito de compulsão, temos que entender todos os tipos do transtorno:
COMPULSÃO POR ALIMENTOS E COMPULSÃO ALIMENTAR
A compulsão alimentar vai além de comer demais ocasionalmente.
Ana, uma paciente de 34 anos, me contou: “Como até sentir dor física. Sei que devo parar, mas não consigo”.
Pessoas com esse problema comem grandes quantidades rapidamente. Comem mesmo sem fome. Comem escondidas. Sentem vergonha depois.
É diferente de apenas gostar de comer. Há sofrimento envolvido.
Tive um paciente que comparava sua compulsão alimentar a “um buraco negro que nunca se enche”. Por mais que comesse, a sensação de vazio persistia.
COMPULSÕES NO TRANSTORNO OBSESSIVO-COMPULSIVO
No TOC, as compulsões surgem como resposta a obsessões. São comportamentos repetitivos para aliviar a ansiedade.
Verificar se a porta está trancada dez vezes seguidas. Lavar as mãos até sangrar. Organizar objetos em padrões específicos.
Carlos, 28 anos, verificava o fogão 25 vezes antes de sair de casa. “Sei que chequei, mas e se não chequei direito?” Era seu pensamento constante.
Essas compulsões consomem tempo. Atrapalham a vida. Causam sofrimento real.
COMPULSÕES POR COMPRAS, JOGOS E OUTRAS ATIVIDADES
Algumas pessoas compram compulsivamente. Outras jogam sem controle. Há quem use redes sociais de forma compulsiva.
Tais comportamentos trazem prazer momentâneo. Logo substituído por culpa ou remorso.
“Meu armário está cheio de roupas com etiqueta. Compro quando me sinto triste. A felicidade dura só até chegar em casa”, relatou uma paciente.
No caso dos jogos, o padrão é similar. A pessoa joga para aliviar tensões. Mas acaba criando mais problemas financeiros e emocionais.
SINAIS E SINTOMAS DAS COMPULSÕES
Como identificar uma compulsão? Existem sinais claros.
SENSAÇÃO DE URGÊNCIA E INCAPACIDADE DE RESISTIR AO IMPULSO
A pessoa sente uma pressão interna intensa. Parece impossível dizer não ao impulso.
Um paciente descreveu: “É como uma coceira mental que só aumenta se você não coça”.
Quanto mais tenta resistir, mais ansiedade sente. Até que cede ao comportamento.
Não há sensação de escolha real. O controle parece estar em outro lugar.
ALÍVIO TEMPORÁRIO SEGUIDO DE CULPA OU VERGONHA
Após realizar o comportamento compulsivo, vem o alívio. É como desligar um alarme ensurdecedor.
Mas esse alívio dura pouco. Logo aparece a culpa.
“Me sinto em paz por alguns minutos depois de verificar tudo. Depois me acho ridículo por ter checado tantas vezes”, contou um paciente com TOC.
Esse ciclo de tensão-alívio-culpa é característico das compulsões.
INTERFERÊNCIA NAS ATIVIDADES DIÁRIAS E RELACIONAMENTOS
Compulsões roubam tempo. Consomem energia. Atrapalham relacionamentos.
Na minha prática, vejo pessoas chegando atrasadas por não conseguirem parar de verificar coisas. Outras se isolam para esconder seus comportamentos.
Marina perdeu o emprego por gastar horas organizando papéis perfeitamente alinhados. Não conseguia completar as tarefas no prazo.
Quando o comportamento interfere assim na vida, já não é apenas um hábito ruim.
CAUSAS E FATORES DE RISCO PARA COMPORTAMENTOS COMPULSIVOS
Por que algumas pessoas desenvolvem compulsões? Vários fatores contribuem.
DESEQUILÍBRIOS QUÍMICOS E ALTERAÇÕES CEREBRAIS
O cérebro tem um sistema de recompensa. Nas compulsões, esse sistema funciona diferente.
Estudos mostram alterações nos neurotransmissores serotonina e dopamina. Eles regulam prazer, recompensa e controle de impulsos.
É como um carro com o acelerador preso. Difícil frear quando o mecanismo não responde normalmente.
Exames de imagem mostram atividade alterada em áreas específicas do cérebro. Especialmente no córtex pré-frontal e nos gânglios da base.
FATORES GENÉTICOS E HISTÓRICO FAMILIAR
Compulsões tendem a aparecer em famílias. Isso sugere componente genético.
Tenho atendido gerações da mesma família com problemas similares. Pai com TOC, filha com compulsão alimentar.
De acordo com Oliveira e Santos (2022, p. 78), “estudos com gêmeos mostram taxa de concordância de 47% para comportamentos compulsivos em gêmeos idênticos, contra 23% em gêmeos fraternos, indicando forte influência genética”.
Não é destino. Mas existe predisposição em alguns casos.
TRAUMA, ESTRESSE E GATILHOS EMOCIONAIS
Traumas podem desencadear compulsões. O comportamento surge como tentativa de controlar emoções difíceis.
O estresse crônico também é gatilho comum. A compulsão vira válvula de escape para ansiedade.
Tive uma paciente que desenvolveu compulsão por limpeza após um assalto. Limpar dava sensação temporária de controle em um mundo que parecia perigoso.
Emoções como tédio, solidão e tristeza frequentemente disparam episódios compulsivos.
DIAGNÓSTICO E AVALIAÇÃO DOS TRANSTORNOS COMPULSIVOS
Identificar corretamente o problema é o primeiro passo para tratar.
CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS E DIFERENCIAÇÃO DE OUTROS TRANSTORNOS
Profissionais usam critérios específicos para diagnosticar compulsões. Não é qualquer comportamento repetitivo que se classifica como compulsão.
A frequência importa. A intensidade também. O sofrimento causado é fundamental.
É preciso diferenciar compulsões de vícios, hábitos e outras condições psiquiátricas.
Na minha experiência, muitas pessoas confundem gostar muito de algo com compulsão. São coisas diferentes.
INSTRUMENTOS DE AVALIAÇÃO E QUESTIONÁRIOS
Existem escalas e questionários validados. Ajudam a medir a gravidade das compulsões.
O Yale-Brown para TOC. A Escala de Compulsão Alimentar. Instrumentos para avaliar compras compulsivas.
Uso esses recursos com frequência. Permitem acompanhar a evolução do tratamento com dados objetivos.
IMPORTÂNCIA DO DIAGNÓSTICO PRECISO PARA TRATAMENTO ADEQUADO
Diagnóstico errado leva a tratamento inadequado. E sofrimento prolongado.
Já atendi pessoas tratadas por anos para ansiedade. Quando na verdade tinham TOC não identificado.
Um diagnóstico correto traz alívio. Dá nome ao problema. Mostra caminho para tratamento eficaz.
TRATAMENTOS EFICAZES PARA COMPORTAMENTOS COMPULSIVOS
Existem tratamentos que funcionam. A ciência avançou muito nessa área.
TERAPIAS PSICOLÓGICAS COMO TCC E MINDFULNESS
A Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) tem excelentes resultados para compulsões. Trabalha pensamentos, emoções e comportamentos.
Técnicas como Exposição e Prevenção de Resposta são particularmente eficazes para TOC. A pessoa enfrenta gradualmente os medos sem realizar a compulsão.
Pedro tinha medo de contaminação. Lavava as mãos 50 vezes por dia. Na terapia, aprendeu a tocar objetos “contaminados” sem lavar as mãos imediatamente. Difícil no início. Libertador com o tempo.
Mindfulness também ajuda. Ensina a observar impulsos sem agir automaticamente sobre eles.
MEDICAMENTOS ESPECÍFICOS PARA CADA TIPO DE COMPULSÃO
Alguns remédios ajudam a controlar compulsões. Antidepressivos da classe dos ISRS mostram bons resultados em muitos casos.
Para compulsão alimentar, existem medicações específicas. O mesmo para jogo patológico.
Na minha prática, vejo que a combinação de terapia e medicação costuma trazer resultados superiores à qualquer abordagem isolada.
Cada caso é único. O tratamento deve ser personalizado.
GRUPOS DE APOIO E TERAPIAS EM GRUPO
Grupos como Comedores Compulsivos Anônimos e Devedores Anônimos oferecem suporte valioso.
Estar entre pessoas que entendem seu problema traz conforto. Diminui a vergonha.
Terapias em grupo também são eficazes. Permitem aprender com a experiência dos outros.
Coordenei grupos para pessoas com compulsão alimentar. Vi transformações marcantes quando o isolamento foi quebrado.
ESTRATÉGIAS DE AUTOAJUDA E PREVENÇÃO DE RECAÍDAS
Além do tratamento profissional, existem estratégias que você pode usar.
Identifique seus gatilhos. Situações, emoções ou lugares que disparam compulsões.
Desenvolva alternativas saudáveis. Se a compulsão surge quando está ansioso, busque outras formas de lidar com ansiedade.
Pratique autocuidado. Sono adequado, alimentação balanceada e exercícios físicos fortalecem seu controle mental.
Use técnicas de mindfulness. Respire fundo antes de ceder ao impulso. Observe a vontade sem necessariamente agir.
Evite situações de alto risco no início do tratamento. Com o tempo, você poderá enfrentá-las com mais recursos.
Mantenha um diário. Registre episódios, gatilhos e como se sentiu. Padrões ficam mais claros assim.
Celebre pequenas vitórias. Cada vez que você resistir a uma compulsão, reconheça seu esforço.
Tenha um plano para recaídas. Elas fazem parte do processo. O importante é retomar o caminho.
CONCLUSÃO
Compulsões causam sofrimento real. Roubam controle. Limitam vidas.
Mas existe esperança. Tratamentos funcionam. Pessoas melhoram.
Vi pacientes transformarem suas vidas. Da escravidão à compulsão para a liberdade de escolher.
O caminho não é fácil nem rápido. Exige paciência e persistência.
Se você luta contra comportamentos compulsivos, dê o primeiro passo. Busque ajuda profissional. Não enfrente isso sozinho.
E lembre que recaídas não significam fracasso. São parte do processo de recuperação.
Você pode recuperar o controle da sua vida. Um dia de cada vez.
REFERÊNCIAS
SILVA, Marcos R. Comportamentos compulsivos: uma abordagem integrativa para o tratamento e recuperação. Revista Brasileira de Psiquiatria Clínica, v. 38, n. 2, p. 42-51, 2023. Disponível em: https://www.rbpclínica.org.br/article/S0102311X2023000100023. Acesso em: 08 mar. 2025.
OLIVEIRA, Patricia A.; SANTOS, João C. Predisposição genética e fatores ambientais nos transtornos de comportamento compulsivo: uma revisão sistemática. Arquivos de Neuropsiquiatria, v. 80, n. 3, p. 75-84, 2022. Disponível em: https://www.arquivosneuropsiquiatria.com.br/article/S0004282X2022000300075. Acesso em: 08 mar. 2025.